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domingo, 25 de novembro de 2012

Rasga-me novamente, para sempre.

Naquele momento seu rosto era inteiramente meu. Eu podia beijá-lo onde eu quisesse e do jeito que bem me viesse. Aquele rosto que antes nem sequer tinha a ousadia de olhar de frente, senão por fotos. Agora, em meu quarto cheio de folhas e rabiscos esmiuçados em notas de amor, estávamos sentados em minha cama vazia de substrato. O substrato estava em meu corpo que lutava contra a etiqueta para não contorcer-se desesperadamente diante daquele momento mudo de uma vastidão que nutria desesperadamente minha autonomia. Eu, logo eu naquele instante que mal podia comigo, podia mesmo assim beijar seus lábios à minha forma. Se quisesse ainda, podia gozar em abraços, beijar suas mãos, sua orelha ou sentir o cheiro da crespidão de seus cabelos, ou ainda, veja só, ainda poderia amar de todas essas formas!

Por mais absurdo que me aparentasse, ainda continuávamos na mesma posição já denunciada de nossa escolha: Queríamos um ao outro tal como é o vai e vem do mar que lambe a terra, deixando-a nua e molhada, numa sede que continua insaciável segundo após segundo.Ah! Por falar em mar, esqueci-me de dizer-lhe, enquanto olhava para ver se sua pupila pulsava feito meu coração errante, que eu era do mar. Em minhas mãos espalmadas podia se ver a transpiração exacerbada e constrangedora do bater da maresia em naus de tempos miticamente guardados, tempos da descoberta lusitana em terras indígeno-brasileiras. Podia se ver também a frescura gélida do encontro das ondas em noites de lua laranja em minhas mãos e em meus pés. Todas essas sensações marítimas esqueci de lhe falar naquele instante. Mas, as palavras faltavam-me à boca assim como faltava-me toda a infelicidade de meu desassossego sem resposta que vivi naquelas 3 semanas anteriores.

Faltava-me o calor de teu colo em minhas mãos gélidas. É que naquelas 3 semanas em que ficamos sem nos falar eu já não era mais de mim o que fui com você. Eu só era o sal e a espuma lá do fundo do oceano. Fostes para a tua terra e deixaste-me sem nenhuma precaução de ver-te regressar. Sei, disseste-me infinitas vezes da irremediável natureza de tua viagem; e eu compreendi como quem vê o brochar de uma orquídea negra que não está em meu jardim. Foste e disseste-me que ficava em pensamento, mas eu, na minha amplidão cega por apenas te querer, vi a agonia de minhas lágrimas ao escorrerem sufocadas por minhas bochechas, deixando a prova do que fizeste comigo naquele momento.

O primeiro dia sem ti foi a palavra que não chegou à garganta ao ver em teu lençol marrom e amarelo o cheiro de tuas elevações e de tua pelugem cor de raios de sol batendo nos olhos castanhos ao entardecer costeiro.

Sem mais. Sem mais. Sem mais. Esquece, ora, eu! Esquece disso tudo e volta e te concentra neste momento! Fita-a o mais demorado que o comprometimento de seus olhos permitirem à ti.

Eu largo toda aquela agonia que me destes pelo cometer do que vamos fazer nesta ora! Eu preciso deste teu calor que me escapa, que não acho em lugar algum. Preciso pois já é de doer-me bastante ouvir sem ti os poemas musicados, que se antes de te conhecer pouco me faziam notar-lhes, depois de nossos gemidos DESABAFADOS agora me eram sensação pura de teus cabelos molhados ao vento.

Continuávamos naquele jogo de olhares, e seu olhar, agora estrangeiro, me olhava, me olhava queimando queimando como o céu no inferno. Meu paraíso era ali, naquele instante, naquele momento que prenunciava o que nós dois já sabíamos mas que amávamos por não realmente saber.

E o beijo veio feito brisa mole, feito poesia bem feita, feito a afinação de tua voz cantando Bethânia para todo o meu corpo.

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