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segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

deixar o nada germinar

sem tudo tanto
tudo nada entanto
tanto quanto apenas
nada

sem pranto.
aberto
a nada
no aqui
agora com calma
para que tanto
tire
enxugue
agora nada

hora de perceber
no tudo
nada

sábado, 27 de dezembro de 2014

agito nada

Superfície.
Pedra.
Olhei.
Não me dizia nada.
Agitei.
E quebrou.

Com aqueles pedaços
Não entendia nada
mas vi
aquilo me dizia
hora de deixar a manada

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Contraste

Com licença, um contraste bem passado por favor. Comerei aqui mesmo, podemos conversar enquanto isso, caso não tenha outros contrastes a serem servidos. Olhando para o prato de súbito percebi: era possível comer esse prato? Opostos que desceriam goela adentro, misturando-se numa massa pastosa no estômago. Dentre os extremos, fica o humano para deglutir e redistribuir pelo pulsar de veias contraídas, entupidas ou relaxadas ao som do sangue refém do bombear de corações entre a renda bordada de pontos tristes e alegres.

Mas nós brigamos tanto ou são os argumentos que tornam-se demasiadas pastas de vida própria, enquanto assistimos bastante afastados um do outro o embate? Acalme tudo isso, desligue todas essas luzes, vamos sair dessa sala, no final ainda continuamos humanos. Continuar humano. Observe as últimas partes dessas palavras. Amo(s) ano(s). Amor é tempo. Tempo é amor.

Veio queimado: era uma panqueca. Pode trocar? Não, todas são assim. Esse é o ponto do prato. Coma que a vida está aí nessa panqueca queimada. Traga-me um suco de laranja, por favor. Tragar você? Não entendi a última parte. Suco de laranja, por favor; não vou aguentar comer assim. Saindo em 3 minutos. Costumam associar o amor ao açúcar, acho que deve ser por isso. Depois dei um bom dia com a boca com pedacinhos amargos de panqueca e doces dos gomos de frutose da laranja.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

do mundo [eu]

humano
[crescimento]
deparar-se que o eu é concreto
mergulhado na imensidão
do etéreo

de pensamento é pedra
dos caminhos infinitos
a maré rebocando que se pode segurar é o eu
a água ricocheteando em si mesma depois de uma maré rebocada é o mundo

loucura
banhe-se dela
antes que anoiteça para quem é de sol
ou antes que amanheça para quem é de lua
no final,
lua e sol são a força da maré rebocando que se segura
enquanto se dá um sorriso de felicidade
gerou vida
.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

quando palavra hoje

meu amor, dê-me um abraço, acalma esse coração.
respira. sente o tempo cotidiano. não tome esse goles de água exagerados ansiando pelas lágrimas a jorrarem. usa teus olhos para ver os milagres cotidianos. deixa-os voar, deixa-os respirar pausadamente e aproveita a visão que te foi dada.
acalma esse coração.
hora de ir ao mar. tomo um banho antes? preciso tirar os miasmas. o mar exige desnude físico e mental. já sinto uma inquietação. o mar me chamo e meu corpo se arrepia feito onda a ir e voltar jorrando por todo o meu corpo o físico de suas abstrações inerentes em toda a minha pele todo o meu pensamento. eu te amo mar.
acalma esse coração.
tranquilo, baby.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

quanto até quando?

daí que eu me sinto lá em baixo
velho
cansado
sem fome
com os olhos baixos
nadando em direção ao centro
abrindo panos escuros
com o estômago embrulhado
e vem,
numa tentação irresistível de ir afundando
no fim do dia
pressentindo
olhando tudo isso
perguntado
voltando para as músicas
continuando para as músicas
esgotando a capacidade
anos, pouco tempo, passou um trem de muito
silêncio.
quanto até quando?

terça-feira, 7 de outubro de 2014

relâmpago nº2

vamos transar. sabe o que é, vou morrer. quando transo sinto que vou morrer. morte de desintegração de cada parte, morte de expansão. para morrer é preciso estar disposto. coloque o sexo que faço contigo em cima d'uma pétala de lírio para observar a matéria prima fazendo poesia, para observar a vida sendo amiga da morte, e eu me desintegrando a cada chupada que dás em meu pescoço. deixa eu gozar enquanto você se desintegra. adstringe as tuas roupas e vem gemer sem medo de que eu te faça morrer. tu não vai morrer. serás co-existindo comigo, ao mar de sons em meu ouvido. curando-me pelo meu cu. postando nossas salivas numa ressaca de ondas pelas dobras de nossos ombros, nossas cinturas, nossa bunda. suor que dessaliniza as palavras do cotidiano que nos aflige. eu gozar você. divida com vírgulas agora a frase anterior. e finja que meu pau tem o nome da palavra mediana.

você gozar eu
gozar você eu
eu gozar você
eu go zar você
vo cê go zar e u
voe go cê u
ucê evo go
goucêevo
você gozar
eu gozar
gozar.

relâmpago

sabiás estavam na ladeira enquanto escrevia com um lápis HB mais um eu te amo, no final de uma mensagem de verão. sabia que estava cansado de escrever aquelas letras, estava cansado de ver a minha caligrafia impressa naquele papel, mesmos signos. queria mudar os caracteres, ficar mais leve. parar de escrever "e", "u", "t", "e", "a", "m" e "o". Outras letras, um "f" talvez ou um "g". a sensação passe ou estou cansado de amar você. retorno de sílabas tônicas com aquela Vodka de noventa reais que você comprou logo no começo, quando só pensava em me foder. queria você agora sem precisar escrever um eu te amo que, provavelmente o tempo se encarregará de jogar fora.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

ensaio #1 da pasta de dente

Escovei os dentes com pasta de aranha. Estava em meu banheiro quando aconteceu. A pasta caiu da escova na pia, a aranha estava lá, já convalescida pela água que havia derramado sobre seu corpo. A pasta se posicionou ao lado. Num gesto rápido, a escova abocanhou as duas substâncias que logo se misturaram entre si com a saliva entre os meus dentes sujos de ovos de gema quase crua.

Meus dentes estavam limpos e o hálito fresco. Beijei um homem depois. Duas horas da manhã, luz ainda tardia, olhei com o hálito de aranha recém desencarnada para os olhos do homem. Ele não notou o sangue aracnídeo em meus dentes. Conversamos por um tempo, arquitetura, bolores de sofá, o cheiro do cream cracker quando se demora num pote, a lua que estava em vênus e o meu desconhecimento de astrologia.

Sensação de que nada acontecera de grave naquela noite. Entretanto, morta em meus dentes a alma da aranha no momento estava a passar pelos lábios, em seguida laringe, do homem que conhecera na noite. Não me sentia culpado. Talvez, em algum lugar das células de minha gengiva, seus componentes orgânicos derramassem sal, lágrimas de mar.

Eu te quero, como a aranha que matei. Faça o mesmo comigo. Coloque-me afogada numa pia e junte-me a alguma substância parecida com uma pasta, que me purifique. Sou tão humano que o impulso é de se estar no lugar da aranha. Na verdade, da mesma que matei afogada a aranha, sou humano. Sou humano que não sou muito bem o que sinto. Rezo para que minha humanidade esteja purificada pelas entranhas da aranha cheia de essência de hortelã, da pasta de dente. Mas então olhem, de qualquer forma, desintegrei aquele corpinho magro de aranha com substância refrescante. Que defunto não gostaria de, em seu cadáver, cheirar genuinamente ao frescor do hortelã?

Sou humano deveras pasta de dente e aranha afogada.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

sem título de dia frio

reduzir é alargar
integralidade do aparentemente não concluído
sente-se, por gentileza, enquanto me espera
é que estou escrevendo um livro
se não for de muito incomodo
espere com uma xícara de café enquanto termino

terça-feira, 29 de julho de 2014

no fundo

porque no fundo,
no fundo,
no fundo,
no fundo,
não tem mais fundo,

chegou em outro fundo,
rasgado por tantos fundos,
desfundidos, perceberam outro fundo

rasgando,
rasgando,
rasgando,
até achar outro fundo

numa tela
numa folha de papel
numa cartolina

depois de tanto tempo e tinta
depois de tanto apagar e reescrever
depois de poucos riscos apagados

rasgaram-se,
no fundo,
no fundo,
no fundo.

domingo, 13 de julho de 2014

risco da palavra

a palavra tem risco
a palavra tem um risco
das duas formas,
risco de cores luminosas
numa folha de raio X

risco até rir do que revi
ao ler palavras que não foram pintadas
na folha de raio X

que raio tem a palavra
que incógnita persegue o risco
do falar aquelas palavras que não foram pintadas?
procurei: risco origem da palavra

domingo, 29 de junho de 2014

palavragem

PaLAVRA
lavrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vrar-vra-vrar
Palavragem
deixa essa energia, amor
vem sorrir em paz, amor
deixa o mar levar , amor
regressa o vital, amor
você não é sozinho, amor
deixa o mar germinar, amor
amar, amor
com ar, sem dor

segunda-feira, 23 de junho de 2014

serbola

Num tapete circular colocamos a vida
Com nossos pés estamos no tapete
Sentimos duas dores
Um dia deixaremos o tapete
Ficamos tristes
Vivemos o dia de ontem
Ainda estamos vivos

Leia um verso e descubra que viver dói
Leia um outro verso e descubra que a dor
É uma felicidade
entre camadas
camaradas
pomadas
cure 
a
enfermidade
de viver.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

sujo, não do Ferreira

eu quero me sujar
recolher o meu passado até formar-se um bolo de sujeira
quero me melar com toda a sujeira concentrada
e sorrir com esse sorriso sujo
eu quero falar alto a palavra sujar
ser sujo é não ter medo de errar
ser sujo é transformar o verso anterior em acertiva, assim:
ser sujo é caminhar torto e devagar.
encher esse poema de sujeira de verbo ser
ouvir o rasgar de tanta quantidade do verbo
deparar-se com espelhos sem se importar
e na sujeira compreender uma rima mal feita
quem se suja
respira livre
sujar é dizer sim
sujar é encontrar os caminhos secretos
da transa poética da metamorfose dessa palavra:
sugar toda a sujeira
e foi a troca do j pelo g
jejum pelo gosto
sentir o gosto, suja-se
guarda isso enquanto tem outros devaneios
e se suja.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

mar: exercício da pele

Memórias.

Escreve sobre o mar. O mundo é azul. O erro não.
Erra
Vai te guiando, menino.
Toco retratos guardados e os lavo com a água do dia numa batéia
Alvejo em Cais necessários
Ao passo que os procuro pendurado nas velas do barco
Terras já compõem parte do íntimo
Alarga percepções
Usa de poucas palavras
Evita, porque é vital

sábado, 5 de abril de 2014

#5 cinematografias de um mundo feito de loucuras escondidas

Laje e cimento são feitos de organogramas terríficos. 
Pensei nisso enquanto olhava para o teto do ônibus. Acendi um cigarro observando distante os rostos das pessoas que afastavam a fumaça que saía de meu nariz. Deixei o vento das janelas assoprar o torpor do tabaco, refrescando as laterais de minhas orelhas, estavam quentes, por razões que convencionei chamar de obscuras por força de hábito de convenções sobrenaturais, ou seja, alguém fala de meu nome em algum lugar deste planeta. Ou também pode acontecer do corpo estar avisando que existem outras inquietudes chamando-me pela pele, o que não era o caso. Que fotos mais lindas e largas daquela exposição, certeza de que não as largaria. Colocaria em paredes brancas também largas e espaçosas na sala do meu apartamento. vem amor, vamos transar mais uma vez na areia inexplorada, depois, é claro, se preferir, posso te fazer massagem enquanto falo frases de músicas clássicas românticas, aquelas bem sertanejas. Coloco até uma caneca transbordando de café para te lembrares que estive aqui. eita, querido, o bolo está no forno, corre que precisamos de prová-lo, coisa boa, provamos o bolo e não lembramos que horas são, aliás, existem dias? espero que estejas gostando de tudo isso, tenho me esforçado deveras para mentir que sou vento e passagem intensa. estava vestido de jornais ensopados de cuspe de bem-te-vi. é uma grande loucura escondida escovar os dentes, colocando a pasta em cima das cerdas da escova ligando a torneira usando aquela água ora desperdiçando pasta e água, ora não desperdiçando, em sentenças de infinitivo: vê, consegue-se, por meio da língua, consubstanciar o findável da prática de escovar os dentes com o infinito que algumas religiões dizem da vida, tudo isso usando-se tempos verbais com substantivos rotineiros; a vida é também feita de  loucuras escondidas. mas, rapaz, caminho de volta para o apartamento, e vejo, sem muito acreditar, um ricochete dourado maquiando a nuvem já vestida de luzes em pôr do sol. um espetáculo pirotécnico num banho-maria mais rápido. embrulhei tudo aquilo e guardei na sacola que trazia os pães. vi mais algumas luzes naquela nuvem, bonitas. continuei a observar, até que árvore tampou-me o campo de visão e revolvi os olhos para o apartamento que já se achegava. ligue o disco por favor, que hoje estou querendo escutar Ney.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

#3 para ler enquanto [tua] respiração esvai

Bom dia
Bom dia
Bom dia
Bom dia
Bom dia
Bom
dia
Bom
dia
Bom
dia
Bom
Bom
Bom
dia
dia dia dia dia dia ia ia ia ia ai.
ia
ia, mentira, bom.
dizer, ia, ai.
om, om, om, om
bd bd bd
em formas.
de encontrar.
de respirar.

-

Bom dia.

#2 plus I told u

minha mãe sempre cantava enquanto alisava meu rosto durante uma noite qualquer de frio ou de tosse, uma música que falava sobre jesus de Nazaré, cresci com essa melodia sendo cantada por sua voz. desconhecia a gravação original, o autor da canção, a época em que foi feita e o seu contexto e religião. achava mesmo que era um cântico de tempos de mães que se estendia infinitamente aos tempos de filhos. sem denominações de mercados sonoros. daquelas músicas que se nasce do saber popular, da vivência dos silêncios nas janelas de interior, vendo as crianças correrem por ruas de terra batida, num campo de seca, onde o sorrir de todos os dias é feito pelo suor entre as costelas aparentes de meninos que nem líquido para esbanjar aquele suor eles próprios tem. mas, mesmo assim, ainda suam, porque é preciso viver. certamente sentia que era possuidor de um coração em horas de noites acalentadas por essas melodias. órgão que está ali mesmo com os poucos momentos que dizemos para ele que também estamos ali. estar-se ali, sentido com a seca invadindo os olhos, gotas significativas a molhar a terra despercebida. carregar-se numa feirinha de tijolos azuis de líquidos neandertais. rever-se numa procissão de boias congeladas. florescer nunca foi de história passada. profusão de estrelas, citações herméticas. citações embaraçadas. citações necessárias para passar. brum e acordo dentro de um sonho incompreensível de fundo completo branco onde qualquer respiração é cor, qualquer sentido é materializado e exposto aos olhos do sonhador. e você vê que talvez não suportes olhar para tudo isso. e eu ponho um ponto e vírgula numa fachada sonhada, sem melodia ritmada. passaria ferro enquanto engomo textos para expor em varais de mim? enquanto você não torna a voltar e eu te pergunto por em que horas anda o teu coração. eu te pergunto sobre ele, começo a falar deveras sobre ele e tu se lembras que além da respiração a impulsionar o sangue, ele também te guia nas possibilidades que a vida te coloca para ser colo de quem te demora. nesse instante acordes condensados reverberam-se no trançado de respirações ofegantes, compassadas e repassadas para outrem. quero falar tudo de outra forma, porém com os mesmo sentimentos, apenas com outras letras e outras palavras que não soem tão feitas específicas para essas ocasiões. historinha pro sinhozinho contar pra mãe preta? continuemos então no texto, com índios distantes pousando no hemisfério sul da América. com os risos imaginados, com tudo isso que se insiste em ficar, promessas feitas no silêncio entre as palavras. dói da mesma forma que o prazer se limitou a dizer tudo num espaço de mim feito de estrelas marítimas. cada verso é um trago para todas aquelas pessoas sentadas no bar que tu me conheces-te. bem, raciocínios exatos voltaram ao encontro do começo. junto com aqueles sentimentos que sempre voltam em horas necessárias. a tristeza do jeca falou com o coral espírita que pulou para a banda do seu pretinho num canto em conjunto dos doces bárbaros. redomas necessárias para continuar andando em vias próprias. belezas de otto, coisas que são acesas por dentro. todas essas costuras desvendaram-me de surpresa. e talvez, depois do amanhecer em princípios de frieza e calor, todo o significado tenha se esvaído pela mesma cor de ferrugem em calhas de casas distantes.

domingo, 30 de março de 2014

#1

veja bem, meu bem
sente-se aqui, precisamos conversar
nunca mais você apareceu
e agora voltaste vendo-me em olhos lágrimas quentes
numa voragem pedindo sons de você para os meus ouvidos
numa passagem que fazes com tuas mãos, entre meu rosto, escuto o som do mar redento numa madrugada
mira e não se sabe mais razão de ser de barragens frias que alguns dizem deixar a vida em vias menores
requerer dentro da certeza que o sol faz naquele fio de água a descer pelas calhas das casas ao misturar-se com o amarronzado do ferrugem
se sabe que é preciso falar para viver
não me escrevam sobre vida
não vês o quão simples é olhar as toalhas no varal das casas vizinhas sombreadas por duas altas, mangueira e figueira, a compor a mesma melodia de calmaria feita quando teu corpo se torna a minha proteção?
olha só, amor
em músicas de varal vão se costurando os aviõezinhos da toalha com que enxugas o teu corpo depois de luzes frias banhando dois olhos quentes 
uma chave sem medo é deixar-te me ver em olhos todos seus
é não conseguir disfarçar o sorriso encostado na tua boca dizendo tuas nomeações em mim
rabiscados mal feitos por força de músicas com sorvetes cheirosos
eu digo enquanto deixo você me ver: decifra-me
numa cifra de letra de música
num canto que só diz ser tudo o que se sente
em crônicas de dias de semana
sambinha bom com Mallu
aqui em casa com Mariana
quero continuar cantando pra você 
e tudo isso vai ficando um texto descompassado
sem cerimônia, nem rima, só mesmo com eu e você

sábado, 1 de março de 2014

sobre imagens de flores que florescem

eu te vi no futuro
e gostei de você hoje
meio como numa canção de João Gilberto
meio como numa canção do Tom Jobim
vem por aqui enquanto escuto músicas populares
um samba com o fôlego acabando nos últimos versos das primeiras estrofes
numa crônica salgada de um meio dia de domingo 
fotografando os pegadores da varanda
lençóis esvoaçando e eu cheirando amaciante pensando ser você me soprando
vento em estrelas numa tarde de grama verde 
eu pensando em você, indo e vindo, balões sem gelo
quentes feito o reflexo da luz dessa mesma tarde no lago do parque onde estamos deitados
terra molhada de calmaria e observação
repara que eu te uso para escrever tudo isso e acalmar um coração
feito de músicas novas e pães fermentados 
dois pontos e repara no próximo verso

sábado, 15 de fevereiro de 2014

conto de tessituras cotidianas

Corte em tela quadrada, adentre e observe o beijo de choque entre os dois carros que vinham em direções retangulares, na descida em preto e branco. Debaixo das calçadas de paralelepípedo dizem ser morada de constelações feito plantações de alfazema, beleza em fileira, numa ordem certeira. Revê o viés dos saxofones emitindo esse som que o cotidiano grita de nostalgia ao vê-lo sair na música
entre esses amontoados de pessoas públicas, em locais públicos, quase em banheiro público. Agora conte os sapos da rua numa cidade nos fundos do Estado, sem saber da constelação que é falar o nome da Capital.

- Vem, sem divagar.
- Vou
- Me olha
- Sim
- E a lua?
- Também
- Então diz a ela
- Eu te amo, lua
- Pede para que nos ilumine
- Nos ilumina lua
- Engraçado/o que/ ilumina lua/ oi?/ o som dessas palavras juntas/ hum/ é bonito/ a língua da gente faz movimento de ventania/ é a luz da lua vindo em nossa direção/ ou é o calor de nossos corpos juntos fingindo ser a luz da lua nos iluminando/continua a fazer essa ventania dizendo baixinho no meu ouvido/ quero te falar de outras ventanias/ então fala, mas começa por essa ilumina lua/ ilumina lua/ ilumina lua/

Fiz uma iluminura com a capitular beijando os teus olhos fugidios.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

vai passar nessa avenida um samba popular...

O samba veio ser meu amigo, enquanto que, você, já nem sei mais quais são os meus olhos quando te encaro de frente, na tela do computador, em fotos. Estou aqui no beco de sobrados com os tijolos aparentes, paredes de vários descascados de tinta, restando apenas ao prateado dos paralelepípedos, que cintilam por causa da chuva, o novo, numa aparente sem memória. É domingo, amor. E eu me lembro que nossos abraços eram poucos, uma afronta ao tamanho de nossas conversas sobre quem amávamos naqueles tempos, nossos passeios sem dinheiro no bolso, nossas crises de riso. Nossas. Quantas Nossas tivemos nesse tempo? És tu próprio vindo de uma em terra. Certamente, mais de uma tens. 

O mesmo, mesmo, no entanto, estando assim, não podes omitir de mim. 
Personas se derramam em baldes de tempo-verdade
Um descompasso, rezo para que seja,
Uma cadência, toma o meu samba, guarda-o em tua fonte
Leva-o consigo como quem pretende levar a vida, num cartola compassado 

Quem sabe se não é só mais um domingo triste e que passou rápido?

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Enquanto lia...

Deixo a minha voz contar histórias para o filho que me abraçará de Pai um dia. Todos os dias, antes de dormir, é claro, subtraindo-se o entusiasmo inicial e o cansaço do trânsito nosso de cada dia, contarei histórias para ele. Então, começará a memorizar o jeito com que pronuncio as palavras, gostando de algumas sílabas, não importando-se com outras. E eu lhe direi que um dia, não muito longe, conhecerá cada hora da madrugada. Tateando como os outros, já com moedas vividas. Também lhe falarei de meus pensamentos em épocas de meninice logo antes de dormir: o que me era mais marcante no dia se vestia, feito vestido de água, numa névoa escura, por ser assim triste, como quem tem, já guardado no pensamento, a certeza de que aquilo já passou. Saudosismos de infância. Empolgado com a leitura, não percebo que o pequeno, enfim, dorme, fácil e silencioso. Hoje, novamente, completei-me de uma coragem chamada alegria.